Salas superlotadas, desinteresse, pouca participação da família, indisciplina, violência, pouco reconhecimento, desvalorização..... nossa, se eu fosse enumerar todos os problemas que vejo na educação essa leitura ficaria enfadonha. Há muitas coisas que não só me deixam insatisfeita como são pedras no caminho do desenvolvimento da escola e, consequntemente, das crianças. Mas estou escrevendo aqui hoje para contar um pouco de uma atividade que adoro realizar com meus alunos da Escola Municipal Bernardino de Souza Pereira, e que, por mais que todo o contexto contrarie, dá muito certo: A Hora da leitura.
Desde que cheguei aqui, há cinco anos, tento trabalhar com literatura. Acredito que meu objetivo principal nas aulas de língua portuguesa é o de formar leitores; críticos, conscientes, assíduos, fanáticos, não sei, mas leitores que reconheçam o prazer e a importância da leitura. Em 2009, aqui mesmo no blog da escola, contei uma outra experiência com leitura bem sucedida, devido à febre da saga Crepúsculo, cuja leitura influenciou positivamente no aprendizado da turma, e esse resultado se refletiu fora do contexto escolar, como a boa nota na prova do Saresp do mesmo ano. Sobre esse trabalho foi feita uma matéria publicada no site oficial da Prefeitura Municipal de Itanhaém.
Tal experiência tornou-se um hábito, embora na escola não haja exemplares suficientes para que toda a turma leia o mesmo título. Por isso, ao longo do tempo, consegui um armário que pudesse ser colocado em um espaço onde eu pudesse ler com os alunos. Nesse armário, que carinhosamente foi apelidado de ‘da fantasia’, coloquei diversos títulos da biblioteca, os quais li durante esses anos. Assim, posso fazer as orientações de leitura de acordo com o gosto e nível de cada aluno.
Vocês podem não acreditar, mas meus alunos pedem por aulas de leitura. Sei que muitos gostam por ser um momento de silêncio em que eles podem pensar na morte da bezerra, mas penso que talvez, mesmo esses, lendo uma página aqui, outra ali, podem acabar baixando a guarda para esse hábito.
Como acompanho os alunos durante a 5ª e 6ª série, vejo o avanço de muitos. Alunos que nem chegavam perto de livros sem grandes ilustrações e letras enormes, hoje lêem narrativas longas.
Essas aulas são muito mais proveitosas que qualquer explicação ou escrivinhações gramaticais. Aqui, os alunos vêm até mim para sanar suas dúvidas de vocabulário, estrutura do texto, organização da narrativa, pontuação. Eles vêem como a língua funciona na prática, aprendem a solucionar suas dúvidas por si mesmos, porque me vêem consultando o dicionário ou lendo um trecho maior do livro pra entender o contexto. Eles se familiarizam com tudo que explico naqueles exercícios "chatos" e muitas vezes descontextualizados da apostila.
Também sempre há algum aluno mais aflito que no meio do silêncio solta: “Nada a ver esse livro! Não tem nada de bolsa amarela aqui!!” (A bolsa amarela, Ligya Bojunga). Muitas vezes nem sou eu quem respondo. Um colega que já tenha lido diz: “Calma, cabeção!! Ela vai aparecer, a Raquel vai ganhar a bolsa.” E outro ainda completa: “Mó pirado esse livro.”
Há momentos que eles leem em duplas ou trios o mesmo título, geralmente algum que fale sobre sexualidade ou as primeiras experiências amorosas, é uma maneira de compartilharem angústias, medos e dúvidas, porque experimentam vivências de outros.
Em uma dessas aulas, quando meus 32 alunos da 6ª A estavam lendo no mais absoluto silêncio, um aluno próximo a mim me segredou: “Impressionante, professora, essa sala só fica quieta nas aulas de leitura”. Eu olhei bem pra todos e respondi: “É porque os livros são mágicos”.
Professora Raquel Santos Zandonadi
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